TAIZÉ

Cochabamba

Ecos do encontro

 
O Encontro em Cochabamba, na Bolívia, teve lugar entre 10 e 14 de Outubro e reuniu 7000 jovens. Além de jovens de quase todos os países da América do Sul, houve uma forte participação de jovens das regiões rurais da Bolívia.

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Um irmão conta como foram as «Jornadas de reconciliação» que acabam de acontecer na Bolívia:

Terça-feira, 9 de Outubro

Ontem e hoje, tivemos dias carregados. Tivemos de levar o nosso local de trabalho para o pavilhão de exposições. Já chegaram com antecedência mais de cem estrangeiros, entre europeus e latino-americanos. É impressionante ver as expectativas dos que chegam e o acolhimentos que lhes estão a oferecer os «Cochabambinos».

Sem dúvida, é um povo que sabe fazer sentir a todos, de onde quer que eles venham, que estão em casa. A sua capacidade de improvisação é inigualável. Mais vale não programar excessivamente e ver depois, consoante o que se vai passando. Por exemplo, ontem os horários de chegada foram muito complicados. Havia atrasos, mal-entendidos; contudo, aqui tudo se resolve com dois ou três telefonemas. A capacidade de reacção das pessoas é surpreendente.

Hoje, falámos à mesma hora para três canais de televisão diferentes: assim, apanhámos todos os que viam televisão antes do trabalho ou da escola. O resultado foi que depois os dois telefones do acolhimento não pararam de tocar durante toda a manhã com propostas de ajuda para o acolhimento de quarta-feira e com ofertas de famílias que continuam a abrir as portas. Ainda falta tratar de muitos pormenores e, claro, temos ainda algumas preocupações para o acolhimento de quarta-feira, mas ao pensarmos em tudo o que se passou, não temos razão para termos medo. Como as gentes de Cochabamba, também acolheremos de braços abertos… e improvisaremos!

Quarta-feira, 10 de Outubro

O acolhimento começou muito cedo. Às 6h30, já havia trezentas pessoas que esperavam para serem acolhidas, a maioria eram grupos peruanos, chilenos e argentinos.

Durante a manhã, o acolhimento foi fluído e calmo, mas, com o passar das horas, transformou-se numa torrente. O «Cochabambinos» começaram a chegar por volta do meio-dia, quer os jovens das cidades quer os das regiões à volta. Tinham saído de casa apenas nessa manhã. Foi assim o princípio da «festa das cores», com todos os jovens das áreas rurais a vestirem os seus trajes tradicionais. O arcebispo admirou-se quando viu chegar o grupo de uma certa zona rural de Cochabamba. Um mês antes, ele tinha tido de ir a este local depois de um telefonema do pároco. Os habitantes tinham apanhado um ladrão. Como este ladrão já tinha cometido outro delito sem que a justiça tivesse feito nada, as pessoas queriam linchá-lo. O padre tinha conseguido impedir a execução deste castigo apenas por algumas horas. A presença do arcebispo tinha acalmado as pessoas e evitado a pena. Hoje, a grande surpresa era ver quase todos os jovens deste lugar cheios de uma grande alegria e dispostos a participar nas jornadas da reconciliação.

Às 5 horas da tarde, as filas do acolhimento e do lanche acabaram por se misturar… claro que a do lanche se tornou mais importante.

O acontecimento mais «latino» do dia passou-se à hora da oração: cinco minutos antes de começar, faltou a luz. Depois de algumas tentativas de reparação, acabámos por convidar os jovens a entrarem no pavilhão da oração apenas com um megafone, enquanto o coro cantava a plenos pulmões. Os milhares de jovens que já tinham chegado entraram num clima profundo de oração. Apesar de toda esta emoção e das improvisações, conseguimos deixarmo-nos preencher por uma grande sede de oração e de encontro. Sim, é possível fazer muito com quase nada. Quanto à improvisação, também a praticámos no acolhimento, onde cinco carros se encarregaram de acender os faróis para iluminar os cinco sítios necessários para continuarmos a acolher.

Quinta-feira, 11 de Outubro

As paróquias transformaram-se: os bancos desapareceram, menos luzes do que habitualmente, algumas imagens sobre o altar, muitos jovens a prepararem-se muito cedo para a oração. As orações são simples e humildes; foram os próprios jovens que as prepararam, as animam e as partilham.
Depois de uma apresentação da paróquia e dos participantes, partem todos para o «Campo Ferial» para a oração. O fantasma da electricidade persegue-nos… mas, ainda assim, está tudo pronto para que a oração corra bem. Não há espaço suficiente no pavilhão de oração. Os jovens que ficaram de fora seguem os cânticos e escutam o Evangelho com atenção. O silêncio é denso. Nunca tínhamos imaginado que um povo tão alegre e festivo fosse capaz de um tal recolhimento. Sem qualquer dúvida, há neles uma profundidade interior.

Nesta noite, o irmão Alois convidou-os a «lutar com um coração reconciliado».

O desejo de partilha reflecte-se, depois de uma abundante refeição, nos workshops muito frequentados. Ninguém falta ao encontro. Pode sentir-se a vontade de partilhar e de aprofundar a fé. Quando os sinos chamam para a oração da noite, os cânticos, até então tímidos, transformam-se em fogo: «Nada te turbe, nada te espante … Sólo Dios basta» ressoa como nunca no pavilhão. Podíamos cantar a noite toda…

Sábado, 13 de Outubro

A diversidade de participantes no encontro impressiona-nos a todos. Ontem, durante uma reunião de apresentação, houve muita alegria e aplausos para os 32 países representados e para todas as regiões da Bolívia.

Hoje, a oração do meio-dia foi muito bonita. O que mais toca a todos é o silêncio. Quando saímos da oração vamos para as filas do almoço, ouvimos os jovens a cantarolar alguns cânticos: «Dios es amor…» «Nada te turbe…». Sem dúvida, o que é mais cantado é o Aleluia. Sempre que, na oração, é proclamado o Evangelho ou qualquer outra passagem bíblica, o cântico de Aleluia ressoa com muita intensidade.

É bonito vermos como a oração de intercessão é uma parte fundamental da liturgia, aqui na América Latina: rezar pelos outros está no coração de todas as celebrações. O Kyrie eleison é cantado com a mesma força do Aleluia. Não há dúvida de que Deus ouve a nossa oração!

Nesta tarde, reunimo-nos por países e por regiões. O encontro para os bolivianos foi animado por dois irmãos e pela pastoral nacional de jovens, para indicar a continuidade daquilo que foi começado durante estes dias. Os jovens chilenos, que eram quase trezentos, tiveram um encontro só para eles. No final, decidiram começar imediatamente a reconciliação com um gesto: saíram todos do seu local de reunião e foram interromper o encontro dos bolivianos para lhes darem o abraço da paz. Uma maneira de lhes agradecerem, mas sobretudo de lhes pedirem perdão por todos os problemas que marcam as relações entre os dois países.

Tinham sido dadas três pistas de reflexão: «Como pode a oração estar no coração do meu compromisso pastoral?»; «Dar um espaço maior para a escuta, pôr-se ao lado dos outros»; «Ir ter com os mais pobres, com poucos meios».

À noite, o irmão Alois fez alusão à amizade que Deus nos oferece e deu o ícone da amizade a todos os países representados da América Latina, e a cada departamento da Bolívia:

«Este ícone ajudar-vos-á a cumprir as pequenas «peregrinações de confiança» nos locais onde os jovens se encontram, de uma cidade para outra, de uma paróquia para outra, num hospital ou num centro de acolhimento de crianças abandonadas, ou em quaisquer outros locais onde há pessoas a sofrer.

Desta maneira simples, poderão transmitir a Boa-Nova do Evangelho e viver a dimensão missionária da nossa fé.»

Domingo, 14 de Outubro

Dia da partida. Há outra vez sacos por todo o lado! A Eucaristia começou às 11 horas da manhã: de novo, o surpreendente recolhimento de um povo turbulento». Na sua homilia, o bispo de Cochabamba, D. Tito Solari, falou sobre os três ensinamentos do encontro: primeiro, que Jesus é o guia, o companheiro de viagem, sendo a oração e o silêncio os locais por excelência em que nos encontramos com ele. Depois, convidou os jovens a criar «micro-climas de reconciliação» nos sítios onde vivem. Por fim, disse com doçura e firmeza que os jovens não podem atravessar a vida, atravessar a história sem deixar um traço, sem marcar um caminho.

No final da Eucaristia, os chilenos entregaram ao bispo uma carta. Era uma carta aberta dos jovens chilenos aos jovens bolivianos onde lhes pediam perdão. Foi o momento mais emocionante do encontro. Não se pode dizer que os aplausos tenham sido fortes, uma vez que as mãos de todos estavam mais ocupadas a enxugar as lágrimas de alegria.

Todo acabou com a saudação da paz que tinha sido deixada para o fim, depois da bênção. Foi bom que o encontro tivesse acabado assim. A última palavra que muitos nos diziam quando partiam era: «A paz esteja contigo.»

Última actualização: 7 de Novembro de 2007